Teus pensamentos bem acima do meus pensamentos

E tudo  o que eu vivi, tive a certeza de que nada que aprendi é certo.
O caminho reto e certinho não é, sempre, o de Deus.
A palavra amiga não é, sempre, do amor.
A mão que acolhe não é, sempre, da salvação.
O braço que sustenta não é, sempre, da proteção.
O corpo que aquece não é, sempre, da cumplicidade.
O teto próprio não é, sempre, o da tranquilidade.
A casa nem sempre é um lar de amor.
O homem ao meu lado não é, a alma gêmea.

E tudo o que eu vivi tive todas as minhas certezas dilaceradas pelo mundo, que não é materno, que não sabe o que é passar a mão, acolher, proteger, salvar.

E eu tinha certezas inabaláveis.

Mas quando olhei pro lado e vi tanta coisa que achava injusta, que não compreendia e antes virava as costas e fingia que não existia. Ai, caí por terra e rastejei nas certezas de Jesus Cristo, em suas palavras, em sua vida de uma forma diferente de que todos vêem, com suas palavras certas, seus versículos, capítulos e páginas. Eu não sei mais ver minha Fé como antes, hoje ela me quebra ao meio, me testa, me angustia, me incomoda. Não tenho mais a Fé tranquila do cristianismo, nem a Fé exaltante das outras religiões, que põe nós, simples servos como senhores de nossas certezas...
E não sou mais tranquila ao falar da vida. Quando me vem a tona a morte eu caio por terra, não sei lidar com dor nenhuma, principalmente, quando não sei onde se encontra no meu corpo.
Só sei dizer a Deus que estou errada, que sou um pedaço de mim, que não consigo seguir com minha missão, porque ela é grandiosa, é de luz e eu estou tão pequenina, tão burra, tão dilacerada.
Não sei mais nem falar coisas bonitas, viver sentimentos bonitos, me entregar a ilusão, porque eu desaprendi a me entregar ao meu coração. E hoje pra mim ele (meu coração) é meu inimigo, só quer me destruir de novo, porque ninguém foi culpado de minha dor, só meu coração, só ele que acreditou, meteu a cara e seguiu seus instintos, que não são maternos, que não protegem, que não salvam.
Meu coração me ensinou a acreditar nas pessoas que me ajudam, a confiar em todos, a acolher um abraço, um aperto de mão, um sorriso. Ele me ensinou que um rostinho bonito é a face do bem, que uma gentileza é sempre dizer sim, aceitar, ceder, fazer por si e pelos outros, amar exigindo amor, amar exigindo perfeição, traçar a vida com fórmulas certas, seguir o caminho mais claro, mais largo, mais reto e certinho.

Hoje, Jesus me ensina, que sua face não é a minha e sim, aquela face feia de homens que sofrem ao meu redor, aquela face suja de dor, de sofrimento, de injustiça, a face de um deficiente físico, de um deficiente mental, de um canceroso, de um leproso, de um aidético, de uma criança mutilada, de um velhinho abandonado num asilo, ou numa casa sozinha.
Eu tento não falar o que vejo hoje nos ensinamentos do Senhor porque não é bonito para outro ser humano ver Deus no homem que sofre, na mulher que é violentada, em toda a face sangrenta da violência, na criança desrespeitada pelo seu próprio protetor, seu próprio herói, no homem invadido pelas drogas, pela química que encobrem a alma maltratada pela dor de ter sido a vida inteira jogado na sarjeta pelo próximo. O Meu Senhor, não é meu, nem é seu, é único, é onipotente, é onipresente, é onisciente.

Deus é tudo, e está dentro de cada um de nós, pois nós somos pedacinhos dele, e estamos nele como ele está em nós. E a certeza que tenho é essa, somos um só em Deus e ele é tudo em nós. Então como não ver que sofro, que sou injustiçada, que sou violentada, que sou desrespeitada sem me incomodar, sem me angustiar, sem sentir dor?

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